Existe uma opção de
conduta civil que tem me agradado, senão ao menos despertado o
interesse em saber se é confortável: o vaca de presépio.
Acompanhem meu
raciocínio, sempre lento e a estas horas, pré-almoço, ainda mais
vagaroso:
1) O vaca de presépio
não tem preocupações políticas. O que lhe for oferecido é quase
como uma dádiva divina que merece, além de respeito, um enorme
sorriso de admiração destinado àquele que o agrada, mesmo que
momentaneamente;
2) Seguindo a mesma
linha, o vaca de presépio (passemos a chamá-lo somente de VP,
economizando dedos e teclas) é satisfeito profissionalmente, pois
mesmo que lhe ocorra a pior desgraça possível -- ser comandado por
um asno -- sempre aceitará com paciência qualquer eventual acinte
por parte de seus superiores, mesmo custando anos de dedicação a um
projeto, que fatalmente irá água abaixo;
3) O VP é um cara
legal para casar, seja VP homem ou mulher. O VP assiste à ruína de
seus relacionamentos com a mesma cara de entusiasmo que eu faria
assistindo uma tórrida partida de gamão via web de 56kb. Assim, o
VP é o cidadão amoroso que prefere dividir o bufê a comer de
marmita todo dia, logo VP e corno, tudo a ver. Seja vaca ou boi de
presépio;
4) VP, o original,
acredita que tudo é questão de momento. Rei do deixa disso e de
delegar á idade das pessoas o custo de suas más ações, como se
fosse natural um adolescente ser idiota e se drogar ou engravidar; vê
o mundo de um colorido baço e daltônico. E acha lindo;
5) No final das
contas, o VP é o que é: nada. Veio ao mundo a passeio e sente-se
feliz por isso. Sem maiores comprometimentos, pois sempre encontra
alguém com menos preguiça para decidir qualquer momento mais
complicado de sua vida, e assim vive, escorado nas atitudes alheias.
Não seria bom poder
ser assim, ignorante dos fatos e atos que nos cercam? Já não foi
dito antes que a ignorância é uma benção? Pois sendo vaca de
presépio, quase santo por aquecer uma criança, ainda encontra
aliados na Índia e até mesmo no Antigo Egito, onde Anúbis era boi,
não vaca (Nota: boi não tem culhões. Quem fertiliza vaquinhas por
aí são touros).
Sei lá, posso estar
muito enganado, mas essa percepção de vida colorida que tem atacado
uma grande porcentagem da população nacional é extremamente
vantajosa, me parece. Pessoas que tem uma maneira de pensar tão
diferente de mim e que sentem-se felizes com isso, acreditando na
vida cor de rosa que apregoam os líderes políticos desta República
dita democrática, devem ter lá suas razões. Talvez o errado seja
eu, ao contestar quando dizem que determinados problemas óbvios que
assolam a sociedade estejam resolvidos. Quem sabe quem seja daltônico
e tenha a visão desfocada seja eu, que não acredito nas benesses
ilusórias nem em discursos vazios, chatos e muitas vezes arrogantes.
Lá no fundo, sei que
não estou errado -- no máximo enganado. Prefiro ser tido como
chato, golpista, extremista, que viver pensando que com meu bafo
estou aquecendo um cristo qualquer, enquanto o que fazem na realidade
esses que assim acreditam seja tão somente disseminar o mal do
despotismo óbvio, embora maquiado.
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