6 de set. de 2010
a cura
Os tempos modernos são ditos como da tecnologia que possibilita a rapidez na informação, do aculturamento provocado por essa rapidez, pela má conduta de ditos representantes do povo e muitos outros adjetivos, realmente cabíveis.
Existe, porém, um desses tais adjetivos que ao menos para mim tem valor fundamental e que, em tempos distantes no futuro, acabará por ser a marca desta geração: a solidão. Não digo a solidão até certo ponto prazerosa, o momento seu que geralmente serve para purgar de nossas mentes o ruim do dia a dia, aquele tempo de solidão que você aproveita para ler, escrever, fazer a barba ou seja lá mais o que, íntimo, bom. Essa nossa solidão de hoje em dia é cibernética e forçada. Relações virtuais transformando antes bons sentadores de boteco em ótimos cadeirantes de computador.
Essa solidão gera a carência, exposta em letras garrafais por meio de redes sociais. Em um primeiro momento, o cidadão que se habitua a deixar o convívio social real em prol de uma vida virtual -- onde por vezes pode até ser mais respeitado por sua inteligência e bom gosto que na real -- até sente-se bem com o isolamento. Não precisa pagar couvert, não é obrigado a sentir cheiro de cigarro em ambiente fechado, não há o perigo da exposição real aos meliantes que pululam pelas ruas de nosso país mal-tratado.
Mas tudo que é bom, enfada. É o mesmo que substituir a paixão inicial de uma relação em amor acomodado, do tipo xixi de porta aberta. Vira monotonia e o ser cadeirante resolve reaprender a andar e tenta enfrentar o mundo real, ao menos para um chopis gelado com pizza que não venha em caixa de papelão. Nesse ponto nota que os amigos reais casaram, mudaram de cidade, morreram...
A carência, em estágio terminal, é capaz de fazer com que qualquer contato com pessoas reais seja um acontecimento. O entregador do China In Box vira amigão, mesmo sem saber. A caixa do supermercado ouve confidências sobre sua vida virtual que você jamais postaria em seu blog ou Facebook.
O Governo, atento a essas condições críticas que estão começando a fazer vítimas -- como o caso do neozelandês que se enforcou com o mouse -- resolver agir e com isso nasceu a figura do Recenseador.
Um alívio aos mais aflitos, o Recenseador entra corajosamente no ninho dos pardais azuis dos twittes e -- alegria das alegrias -- quer saber de sua vida! O Recenseador, além de ser de carne e osso, quer não só informações básicas. Com um sorriso nos lábios e oferecendo um café, é capaz até de que ele lhe questione sobre sua família, seus hábitos, seus rendimentos. Depois, com um "tenha uma boa tarde" educadíssimo, deixará sua vida, para alegrar a vizinhos seus, que você mesmo nem sabe quem são. Não tenha ciúmes quando isso acontecer, mas é uma fatalidade irremediável.
Há salvação, virtuais amigos. Aqui em casa o Recenseador esteve hoje. Um tanto assustado e com um rasgão no uniforme à altura do colarinho, o que me deu a certeza de que ele havia acabo de sair -- ou fugir, mais propriamente dito -- de nossa vizinha que não sai de casa desde que o ICQ era febre. O coitado fez-nos as perguntas necessárias, tomou um copo d´água com um calmante que a amada esposa lhe ofereceu e partiu, para alegria do vlogger da casa acima da nossa.
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